11.12.15

Carta

Celso de Almeida Jr.


Publicado no Blog Ubatuba Víbora
Coluna do Celsinho
11 de dezembro de 2015

Inspirado na inusitada carta de Michel Temer para Dilma Roussef, escrevo a minha, dirigida à outra personalidade ficcional.
Lá vai...

Senhor Papai Noel:
Consuetudo consuetudine vincitur (Um costume é vencido por outro costume).
Por isso, pensando em mudança, lhe escrevo.
Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo o que me chega aos ouvidos das conversas nas ruas.
Esta é uma carta muito pessoal.
É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha credulidade. 
Tenho-a revelado ao longo destas cinco décadas.
Lealdade pautada desde os livrinhos de historinhas da pré escola.
Sei quais são as funções de um brasileiro.
Ao meu natural bom humor conectei aqueles contos aprendidos na infância.
Entretanto, sempre tive ciência do absoluto descaso do senhor e dos seus duendes em relação a mim e aos meus amigos.
Descaso incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e coletivo às suas atividades. 
Basta ressaltar que no último Natal apenas 59,9% dos amigos declaravam acreditar no senhor.
E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu que simulava o sininho das renas.
Tenho mantido a unidade dos conhecidos apoiando o seu trabalho, usando o prestígio que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no mundo da fantasia.
Isso tudo não gerou confiança em mim.
Gera desconfiança e menosprezo de sua trupe.
Vamos aos fatos.
Exemplifico alguns deles.

1) Passei os últimos tempos como decorador de árvore de Natal. O senhor sabe disso. Perdi todo o protagonismo que tinha. Só era chamado para resolver onde colocar o pinheirinho.

2) Eu e demais aliados deixamos de ser chamados para discutir a efetiva entrega dos presentes; éramos nós mesmos os acessórios, secundários, subsidiários.

3) O senhor, no Natal recente, à última hora, não renovou com Devlin, o Motoqueiro, que o auxiliava a levar o saco dos presentes, que fez um belíssimo trabalho, elogiado durante os últimos anos. Sabia que era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a registrar este fato no dia seguinte, por cartinha, como nos bons tempos de menino.

4) No episódio do Coelho Ricochete, mais recente, ele deixou a missão em razão das muitas desfeitas, culminando com o que aqueles seus duendes fizeram a ele, retirando, sem nenhum aviso prévio, o fiel Blau Blau que ele, coelhinho, indicara para ajudar na entrega. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta "conspiração".

5) Quando o senhor fez um apelo para que eu assumisse a coordenação das renas, no momento em que estavam arredias, atendi e fizemos, eu e Ricochete, aprovar um ajuste no fornecimento de ração. Tema difícil por que dizia respeito aos fornecedores. Não titubeamos. Estava em jogo a capacidade de entrega e a qualidade da comidinha. Quando se aprovou a negociação, nada mais do que fazíamos tinha sequência. Os acordos assumidos não foram cumpridos. Realizamos muitas reuniões solicitando apoio, com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação.

6) De qualquer forma, eu coordenava como podia e o senhor resolveu ignorar-me chamando o Bóbi Filho e o Bibo Pai, personagens de outra historinha, para fazer um acordo sem nenhuma comunicação a mim e aos meus colaboradores. O Lippy e o Hardy, sabe o senhor, foram indicados por ele. E o senhor não teve a menor preocupação em eliminar o Wally Gator, um colaborador a mim ligado.

7) Democrata que sou, converso, sim, senhor Papai Noel, com outras figurinhas que povoam as fantasias infantis. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Sindicato da Ilusão. Aliás, a primeira investida buscando reforço para a entrega dos presentes teve o apoio de 8 membros da Liga da Justiça, 6 da Corrida Maluca, além dos 3 destemidos Mosquito, Mosquete e Moscardo. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema de entregas. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos unificar todos os personagens infantojuvenis na gigantesca tarefa da distribuição de presentes. Os duendes, sob o seu comando, resolveram difundir e criticar.

8) Recordo, ainda, que o senhor, manteve reunião de duas horas com o Manda Chuva, com quem construí boa amizade, sem convidar-me, o que gerou, no Batatinha e no Espeto, a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Manda Chuva o Papai Noel não convida o seu grande colaborador? Antes, no episódio do Guarda Belo, quando as conversas começaram a ser retomadas, o senhor preferia mandar o Dom Pixote cantar Oh querida Clementina! para o Manda Chuva. Tudo isso, sem sentido algum, tem significado absoluta falta de confiança.

9) Mais recentemente, conversa nossa foi divulgada e de maneira inverídica, sem nenhuma conexão com o teor da conversa.

10) Até a compilação das ideias do Olho Vivo e do Farofino, propostas muito aplaudidas, que poderiam ser utilizadas para recuperar nossas fragilidades e resgatar a confiança foi considerada manobra desleal.

11) Eu e meus aliados temos ciência de que os duendes, sob seu comando, buscam promover a nossa divisão, o que já tentaram no passado, sem sucesso. O senhor sabe que, como líder, devo manter cauteloso silêncio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade destes tão diferentes personagens infantojuvenis.

Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que teremos tranquilidade para crescer e garantir mais presentinhos Brasil afora.
Finalmente, sei que o senhor não tem confiança em mim e nos meus amiguinhos, hoje, e não terá amanhã.
Lamento, mas essa é a minha convicção.
Respeitosamente,
Celsinho

Paixão de um homem
Waldick Soriano